segunda-feira, setembro 05, 2005

NO DIA DA POESIA


AI POESIA !


Ouvi um dia
que a poesia,
muita atenção,
virou em pão ...

Pois é verdade,
por piedade,
se tal houvesse
oh, mais viesse!

Pois cada home
cheio de fome
viver não qu' ria
sem ter poesia...

Ai, que m' donho
parec' um sonho
que neste dia
haja poesia.

Olá, poetas,
tomai canetas
lavrai a terra
por esta guerra...

Acabe-s' esta
comec' a festa
haj' união
p' ra haver mais pão!

Tudo s' afoite
de dia ou noite,
calor ou frio
como num rio.

Venha mais gente
nesta corrente
pois tudo encarta
qu' a mesa é farta.

Ricos ou pobres,
há sempre uns cobres,
p' ra um bom poema
com este tema.

Riqueza ou não,
poesia é pão,
cantai amores,
ó trovadores !


Frassino Machado
In TROVAS DO QUOTIDIANO

NÃO VENDAS O PENSAMENTO

Amassa o pão que comes
no sal do teu suor:
verás que é bem diferente
o seu sabor.

Não vendas o pensamento
para comprar posição,
não sejas vil instrumento
escravo da opressão :

TRABALHA,
SEMEIA,
ENSINA
E AMA !

Na terra do futuro,
sementes de valor,
verás crescer o trigo
ao teu redor.

Na tua dignidade,
a força de ser homem,
verás como os abutres
já não te comem.

A construir na paz,
no amor e na verdade,
assim conquistarás
a Liberdade.

Não vendas o pensamento
para comprar posição,
não sejas vil instrumento
escravo da opressão :

TRABALHA,
SEMEIA,
ENSINA
E AMA !


Frassino Machado e
Miguel Santos,
in CANCIONEIRO

NAMORADOS COM TERNURA




« Para o dia dos namorados »


Há por aí aquelas namoradas,
que lindas flores são de laranjal...

Há por aí aqueles namorados,
que belos pomos são de giestal.

Há por aí aquelas violetas,
que suave aroma vai por esses prados...

Há por aí aqueles amores-perfeitos,
que belos dióspiros da cor da chama.

Há por aí aquelas margaridas,
que puras obras de arte sem defeitos...

Há por aí aqueles meloais,
que verde clorofila naquela rama.

Há por aí aquelas rosas vivas,
qu’enfeitam os jardins e os quintais.

Há por aí aqueles figos de ouro,
que delícias d’açucar, meu tesouro !

Há por aí aquelas doces mangas,
que às bocas secas levam a frescura.

E sem que os versos meus pareçam tangas,
eis um poema de amor e de ternura !


Frassino Machado
In AS MINHAS ANDANÇAS

MULHER

Entre as obras da Criação
uma fez Deus admirável
entre todas mui notável
quando enche o coração.

A mulher se é orgulhosa
entre as obras da Criação
não será perfeita, não,
e andará sempre chorosa.

A mulher se é escultural
uma fez Deus admirável
com um corpo invejável
longe de ser natural.

A mulher quando é vistosa
entre todas mui notável
tornar-se-á impenetrável
deixando de ser gostosa.

A mulher se é como é
quando enche o coração
terá sempre Deus à mão
e o nome Maria José !


Frassino Machado
In RUDIMENTOS

MISTÉRIO DE MEU SONHO

Quando voltarás, amiga,
do teu exílio medonho ?
Meu bem, deixa que te diga
és mistério do meu sonho !

Se o tempo custa a passar
e minh’ alma está mendiga
diz-me lá, sem mais recear,
quando voltarás, amiga ?

Preferes estar fechada
nesse silêncio tristonho?
Isso não te livra em nada
do teu exílio medonho.

Entendi ser bem verdade
vais recuperar da fadiga.
Ajudar-te-ei com vontade,
meu bem, deixa que te diga.

Quando voltares, acredita,
flores em minh’ alma ponho,
acabando esta desdita
és mistério do meu sonho !


Frassino Machado
In OS FILHOS DA ESPERANÇA

OS LAUREADOS DO OLIMPO - MARCO AURÉLIO

O seu tio Antonino Pio adoptou-o e designou-o como herdeiro em 25 de Fevereiro de 38 ( pouco depois de ele mesmo ter sucedido a Adriano); Marco Aurélio tinha então apenas dezassete anos de idade. Antonino, no entanto, também designou Lúcio Vero como sucessor. Quando Antonino faleceu, Marco Aurélio subiu ao trono em conjunto com Vero, na condição de serem co-imperadores (Augusto / César). Os motivos que conduziram a esta divisão do poder são desconhecidos.No entanto, esta sucessão conjunta pode muito bem ter sido motivada pelas cada vez maiores exigências militares que o Império atravessava. Durante o reinado de Marco Aurélio, as fronteiras de Roma foram constantemente atacadas por diversos povos. Sendo necessária uma figura autoritária para guiar as tropas, e não podendo o mesmo imperador defender as duas fronteiras em simultâneo, nem tão-pouco nomear um lugar-tenente que poderia (tal como, de resto, fizeram Júlio César ou Vespasiano) usar o seu poder após uma portentosa vitória para derrubar o governo e instalar-se a si mesmo como imperador.
Assim sendo, Marco Aurélio teria resolvido a questão enviando o co-imperador Vero como comandante das legiões situadas no oriente. Vero era suficientemente forte para comandar tropas, e ao mesmo tempo já detinha parte do poder, o que certamente não o encorajava a querer derrubar Marco Aurélio. O plano deste último revelou-se um sucesso - Lúcio Vero permaneceu leal até à sua morte, em campanha, no ano 169.
Marco Aurélio casou-se com Faustina a Jovem, filha de Antonino Pio e da imperatriz Faustina a Velha, em 145. Durante os seus trinta anos de casamento, Faustina gerou 13 filhos, entre os quais Cómodo, que se tornou imperador após Marco Aurélio, e Lucilla, a qual casou com Lúcio Vero para solidificar a sua aliança com Marco Aurélio.
Marco Aurélio faleceu em 17 de Março de 180, durante uma expedição contra os Marcomanos, que cercavam Vindobona (a actual Viena, na Áustria). As suas cinzas foram trazidas para Roma, e depositadas no mausoléu de Adriano.
Pouco anos antes de morrer, designou o seu filho Cómodo como herdeiro ( o qual foi o primeiro imperador a suceder a outro por via consaguínea, e não por adopção, desde o final do século I ), tendo ainda em 177 feito-o co-imperador. Muitos historiadores fazem coincidir o início do declínio de Roma com a morte de Marco Aurélio e a ascensão ao trono de Cómodo; diz-se até que a sua morte foi a morte da Pax Romana.

PENSAMENTOS

Nada sucede ao homem
que sua natureza não esteja preparada
para suportar.

É próprio do Homem sábio
amar também os que o ofendem.

Eles possuem a mesma natureza
que tu possuis e pecam por ignorância
e não por vontade.

Lembra-te de que dentro em pouco
estareis mortos tu e eles;
lembra-te, sobretudo,
de que mal nenhum te fizeram,
uma vez que não tornaram
a tua alma pior do que era.

Nunca houve época
em que não se lamentasse o presente
e aplaudisse o passado.

É sábio quem vive cada dia
como se fosse o último.

Os homens nasceram uns para os outros.
Ensina-os, pois, ou suporta-os.


Marco Aurélio, in MEDITATIONES

MINHAS TROVAS À POESIA




A Poesia é a minha terra
a minha terra é a Poesia
e tudo o que ela encerra
tem sabor de maresia.

A Poesia é a minha casa
a minha casa é a Poesia
e todo o recheio é brasa
pela força da ousadia.

A Poesia é como as flores
todas as flores são Poesia
se esta produz amores
aquelas dão simpatia.

A Poesia é o meu fermento
o meu fermento é Poesia
quando a faço dá-me alento
quando a canto galhardia.

A Poesia é a minha seiva
minha seiva é a Poesia
quando a tenho só m’eleva
quando não é nostalgia.

A Poesia é a emoção
toda a emoção é Poesia
emerge do coração
e cresce co’a fantasia.

A Poesia é a minha história
minha história é a Poesia
toda ela tem memória
e é feita em cada dia.

A Poesia é a vivência
e a vivência é a Poesia
não há Arte sem coerência
ou então sem harmonia.

A Poesia é inspiração
inspiração é Poesia
ela habita na razão
que da Arte é moradia.

Se a Poesia tem Arte
toda a Arte tem Poesia
palavras soltas à parte
pois nunca servem de guia.

A Poesia é um farol
quem tem farol nada teme
noite e dia há sempre sol
quando a alma vai ao leme.

Toda a Poesia é bonança
e a bonança é a Poesia
no mar revolto faz dança
no mar baixo calmaria.

A Poesia é o meu Sonho
e o meu Sonho é a Poesia
sem ela o mundo é tristonho
pois lhe falta a bonomia.

A Poesia é a minha Festa
a minha Festa é a Poesia
com Arte ninguém contesta
sem Arte só tem asia.

A Poesia é a minha glória
minha glória é a Poesia
os poetas de grã memória
‘stão comigo à porfia.

Ó vós, poetas, qu’escreveis
julgando fazer Poesia
ou m’engano ou ‘stareis
a sofrer por miopia...

Libertai-vos dessa febre
a qu’alguns chamam Poesia
não troqueis gato por lebre
ou, pior, por cortesia...

A Poesia é grã nobreza
toda a nobreza é Poesia
levantai-vos com firmeza
mostrai vossa fidalguia.

A Poesia é sofrimento
todo o sofrer tem Poesia
pois nos traz ao sentimento
um prazer que nos recria.

Toda a Poesia é materna –
bem materna é a Poesia –
a gerar versos é eterna
de uma eterna energia !

Sou feliz por ser poeta,
entre todos o primeiro,
desta Arte bem discreta
me assumo por inteiro !



Frassino Machado
In TROVAS DO QUOTIDIANO

MINHA VOZ

Minha voz que vem de longe
peregrina esfarrapada
irmã da fome e do frio
irmã do tudo e do nada.



Por caminhos nunca andados,
frente a velhas tradições,
busca seiva e calor
fruto de vida em canções

Minha voz feita criança

corpo de sangue e só de dor
olhos selvagens em noite escura
esperando sol e amor!

Minha voz tinta de sangue
cavalgando em maresia
irmã dos homens e do mundo
irmã do pão de cada dia.

Novos traços de profeta
e coroa de rainha
luz que queima e faz amar
minha voz e voz que é minha.

Minha voz feita criança
corpo de sangue e só de dor
olhos selvagens em noite escura
esperando sol e amor!


Frassino Machado
In CANCIONEIRO


Ir a : www.jardimdeorfeu.no.sapo.pt

MINHA MÃE NATAL

Soa muito melhor e é mais doce ritual
dizer-se Mãe Natal, matando a tradição.
E porque não dizer-se em toda a dimensão
Irmã e Irmão, acrescentando-lhe Natal?

Soa muito melhor e nada há de virtual
dizer-se Avó Natal, com ternura e emoção.
E porque não dizer-se em toda a convicção
Amiga e Amigo, com Natal não estará mal?

Vizinha e Vizinho, com Natal, não sei
ou alguém conhecido talvez não será,
mas Patroa, Patrão Natal não convirá...

Isto de ser Natal, cada gente sua grei,
de nada valerá se a esta vil roupagem
não se der como meta ser da alma a imagem !



Frassino Machado
In OS FILHOS DA ESPERANÇA

OS LAUREADOS DO OLIMPO - SÉNECA


Filho de um retórico também chamado Séneca, Lucio Aneo formou-se em Espanha para depois se transferir para o Egipto. Calígula chamou-o para a corte romana onde alcançou o cargo de questor, o tempo que exercia a actividade de forense. Um discurso pronunciado no ano 39 motivou que Calígula o condenasse à morte, porém Séneca conseguiu escapar à pena capital. Quando Cláudio subiu ao poder, Séneca permaneceu exilado na Córsega durante um período de oito anos. Será a emperatriz Agripina quem reclamará a sua presença na capital imperial, adjudicando-lhe a educação de Nero . Séneca converteu-se num dos personagens mais influentes da corte de Nero quando este alcançou o poder, dirigindo a política estatal em companhia de Burro. Porém quando Nero deu mostras da sua crueldade, Séneca solicitou-lhe para se retirar da vida activa. Possivelmente esteve comprometido na revolta encabeçada por Calpurnio Pison, na qual também participaram Petronio e Lucano. Descoberto o complot, recebeu a ordem para se suicidar, ordem que Séneca executou seguindo os dictames do estoicismo e do neopitagorismo, suas doutrinas filosóficas. Entre as suas principais obras filosóficas conservam-se como parciais ou na íntegra "De ira", "De providentia", "De constantia sapientis", "De consolatione", "De otio", "De Tranquilitate animi" e "De brevitate vitae".


AMIZADE CORRECTA


O sábio, ainda que se baste a si mesmo,
deseja ter um amigo,
quanto mais não fosse para exercer a amizade,
para não deixar definhar tão grande virtude.
Ele não busca, como Epicuro,
«alguém que lhe vele à cabeceira em caso de doença,
que o socorra quando esteja em grilhões ou na indigência».
Busca alguém a cuja cabeceira de doente possa velar;
alguém que, quando implicado numa contenda,
ele possa salvar dos cárceres inimigos.
Pensar em si próprio, e empenhar-se numa amizade
com esse pensamento preconcebido,
é cometer um erro de cálculo.
A empresa terminará como começou.
Fulano arranjou um amigo para dispor,
um dia, de um libertador que o preserve dos grilhões.
Ao primeiro tinido de cadeias, lá se vai o amigo.
Tais são as amizades
que o mundo chama de «ligações temporárias».
O homem a quem se escolhe para prestar serviços
deixará de agradar no dia em que não sirva para mais nada.
Daí a constelação de amigos ao redor das grandes fortunas.
Vinda a ruína, faz-se, à volta, a solidão:
os amigos esquivam-se dos lugares onde são postos à prova.
Daí, todos esses escândalos:
amigos abandonados, amigos traídos, sempre por medo!
É inevitável que o fim concorde com o começo:
o interesse fez de sicrano teu amigo;
o interesse fará com que ele deixe de sê-lo.
Ele se mostrará sensível às vantagens
que lhe sejam oferecidas para que dessirva a amizade,
se, nesta, mostrava-se sensível
a qualquer vantagem fora dela mesma.
Qual, então, o meu objectivo ao fazer um amigo?
O de ter alguém por quem possa morrer,
a quem possa seguir no meu exílio,
a quem possa proteger com a minha pessoa,
a cuja salvação possa devotar os meus dias.

Séneca, in O SÁBIO E A AMIZADE